Ao aterrissar na Índia, seja em Nova Délhi, Mumbai ou qualquer outra cidade grande ou pequena, os ouvidos acordam. O país é regido por uma orquestra de buzinas que desorienta, irrita, enlouquece.
O trânsito indiano transborda o limite do significado dessa palavra. Riquixás, tuc-tucs, bicicletas, motos, carros, ônibus, caminhões, pedestres, vacas, macacos e, dependendo de onde você estiver, elefantes e camelos – tudo se mistura num estouro de boiada, disputando no buzinaço as ruas mal pavimentadas, sem atentar para conceitos tão modernos quanto mão e contramão.
Assim é o primeiro encontro com a Índia: uma cacofonia insana. O que te faz logo se perguntar como encontrar ali, naquele caos de sons, cheiros e cores – porque tudo tem cor, tudo berra, dos sáris das mulheres aos letreiros de neon -, a tão alardeada paz interior.
“Espere o inesperado”, disse-me um alemão na fila do táxi no aeroporto, na sua décima oitava viagem ao subcontinente indiano.
A viagem começa em Rishikesh, a gurulândia pop
Passado o susto desse revolto primeiro encontro e caindo na estrada, ou melhor, nos trilhos, já que a melhor forma de viajar pelo país é de trem, a Índia é de fato um infinito – de possibilidades e de surpresas.
Seguindo para o norte, cerca de 6 horas de trem partindo de Nova Délhi, chega-se ao epicentro, à terra prometida, à meca: Rishikesh.
A cidade é hoje um shopping center espiritual. Ali começa o Himalaia. E ali de certa forma começou a peregrinação contemporânea à Índia.
Em 1968, auge do movimento hippie, os Beatles viajaram para lá. E espalharam para o mundo a fama do guru Maharishi Mahesh Yogi, o mestre da meditação transcendental, ainda praticada por nomes famosos como o cineasta David Lynch.
O ashram que hospedou os Beatles virou uma ruína. Mas nunca mais Rishikesh sairia da rota dos viajantes.
Entre falsos e verdadeiros gurus, entre sadhus de araque e outros comprometidos com a tradição hindu de abdicar da vida ordinária para se dedicar ao estudo dos textos sagrados, a velha cidade oferece uma experiência profunda de contato com as práticas indianas – e com a Índia real, de carne e osso.
Rishikesh fica num vale extravagantemente belo, cortado por um rio verde-água correndo das montanhas glaciais: o Ganges. Vertendo-se para cumprimentá-lo, templos e ashrams.
A cidade é dividida em três partes: o Centro, Ram Jhula e Lakshman Jhula, marcadas por pontes suspensas.
Os sadhus estão por todos os cantos, com suas cuias de esmola, fumando o chilam, uma espécie de cachimbo em forma de cone, recheado de tabaco e haxixe. Os macacos também fazem parte da paisagem.
O comércio assemelha-se a um bazar medieval, com uma portinhola depois da outra, vendendo toda sorte de quinquilharias. A cidade é, resumindo, o encontro da Índia tradicional com a Índia New Age, o encontro dos mantras védicos com a cantora irlandesa Enya.